John Henry Newman escreveu que Shakespeare tinha «tão pouco de protestante nele que os católicos, sem forçarem muito, têm sido capazes de o reclamar como seu». Hilaire Belloc, em consonância com Newman, sublinhou que «as peças de Shakespeare foram escritas por um homem claramente católico no pensamento». G. K. Chesterton chega à mesma conclusão, afirmando que o catolicismo de Shakespeare é «uma coisa que todos os católicos sentem ser verdade por um concordante bom senso». Newman, Belloc e Chesterton retiraram as suas ilações da profunda compreensão da obra de Shakespeare, não tendo o benefício da riqueza da evidência biográfica do catolicismo do Bardo que surgiu na segunda metade do século passado. Hoje, todos aqueles que afirmam que Shakespeare era católico, têm ao seu alcance os factos históricos da sua vida e do seu tempo, bem como a evidência textual inferida a partir da sua poesia e peças de teatro.
Nos nossos dias é amplamente aceite, embora relutantemente por muitos, que Shakespeare foi criado numa família católica devota, numa época em que a prática da fé era ilegal. A família da sua mãe foi uma das mais notáveis resistentes de todas as famílias recusants de Inglaterra. Vários primos de Shakespeare perderam a vida pela sua participação nas chamadas conspirações papistas. John Shakespeare, o pai do poeta, parece ter-se afastado da vida política local para evitar ter de prestar o Juramento da Supremacia anti-católica. Anos mais tarde, em 1592, enquanto o seu filho estava em Londres a fazer a sua reputação como dramaturgo, foi multado por ser um católico desafiante que recusou, por imperativo de consciência, assistir às celebrações da religião do Estado. Anos mais tarde, em 1606, a filha de William Shakespeare, Susanna, também será multada. Tal como o pai e a filha, também William parece ter resistido a participar em celebrações anglicanas.
Shakespeare aparenta ter herdado e abraçado o catolicismo dos seus pais. Aparentemente, foi forçado a deixar sua cidade natal de Stratford-upon-Avon, depois de ter feito um inimigo de peso, Sir Thomas Lucy, um notório perseguidor dos católicos locais, e há evidências de que trabalhou como professor numa casa militantemente católica no norte da Inglaterra onde, com grande probabilidade, se terá cruzado com o mártir jesuíta, São Edmund Campion, enquanto este lá esteve.
Após sua chegada a Londres, os registos mostram que Shakespeare terá, alegadamente, ameaçado a vida de dois extremistas protestantes que se gabavam de ataques a casas de católicos e da queima de crucifixos e livros «papistas». O patrono de Shakespeare, o Conde de Southampton, era um católico que tinha como seu confessor pessoal, outro jesuíta mártir, São Robert Southwell. Há abundante evidência para se poder concluir que Shakespeare conhecia e admirava este santo jesuíta.
Talvez a evidência biográfica mais forte para o catolicismo do Bardo seja a aquisição da casa do caseiro do mosteiro de Blackfriars, um conhecido centro de actividade católica ilegal em Londres, e a sua amizade com John Robinson, um católico cujo irmão entrou para o Colégio Inglês em Roma, a fim de estudar para o sacerdócio. A prova final de evidência biográfica é fornecida pela vontade de Shakespeare, expressa no seu testamento, de que muitos dos seus amigos católicos fossem os seus beneficiários, demonstrando que, sem sombra de dúvidas, Shakespeare «morreu papista» como afirma, lamentando-o, o clérigo anglicano do século XVI, Richard Davies.
Além da evidência esmagadora do catolicismo de Shakespeare, constatada nos factos da sua vida, há ainda uma quantidade enorme de evidências confluentes que emergem das suas obras. Vários dos seus sonetos e poemas aludem de maneira benevolente a católicos conhecidos, mortos ou perseguidos pela sua fé, incluindo São Thomas More, São Robert Southwell, Santa Anne Line e William Byrd. Quanto às suas peças, é evidente a sua simpatia pelos mártires católicos na sua contribuição para Sir Thomas More e no retrato simpático de Catarina de Aragão em Henrique VIII. As alusões à vida, morte e poesia de São Robert Southwell podem ser vistas em várias peças, como Romeu e Julieta, O Mercador de Veneza e Rei Lear. Há ataques velados à rainha Elizabeth I em Ricardo II e Hamlet e uma condenação do cruel maquiavelismo do rei James I em Macbeth. Shakespeare também destila a sua bílis contra os espiões anti-católicos, tais como Lord Burghley e Francis Walsingham, na sua caracterização de Polónio em Hamlet e no tratamento dos maléficos maquiavéis que exibe nas suas peças, incluindo Iago em Otelo, Edmund no Rei Lear, Claudius em Hamlet, e, claro, o diabolicamente implacável Macbeth.
Poder-se-iam ir desfiando as provas do catolicismo do Bardo que emergem da sua poesia e das suas peças. Na realidade, desenterrar tal evidência, seria o trabalho de uma vida para um estudioso dedicado. Contudo, como é necessário saber parar, pelo menos dentro dos limites de um breve ensaio, concluiremos, retomando as palavras de Chesterton, que a lealdade do Bardo de Avon para com a Igreja de Roma é «uma coisa que todos os católicos sentem ser verdade por um harmónico bom senso».